Também de Minas, veio a voz romântica do cantor Luiz Cláudio. No Rio, locais como o Beco das Garrafas, na Rua Duvivier, em Copacabana, tornaram-se pontos de encontro dos músicos e amantes do jazz e da Bossa Nova, O nome do local surgiu do hábito pouco educado que os moradores dos prédios tinham, de jogar garrafas sobre os boêmios que perturbavam a paz noturna, o que era freqüente. Ali, nas boates Bottle’s, Bacarat e Little Club, os amantes do jazz, da Bossa Nova e das garrafas promoviam memoráveis encontros musicais. O Little Club e o Bottle’s pertenciam aos mesmos donos, Giovanni e Alberico Campana, que estimulavam as apresentações de grupos de jazz e Bossa Nova. Muita gente passou por lá neste início dos anos 60: Paulo Moura, Juarez Araújo, Cipó, Aurino, Maciel, Luizinho Eça, Luiz Carlos Vinhas, Sérgio Mendes, Baden Powell, Tião Neto e Chico Batera, entre muitos outros. O Zum-Zum, boate do compositor Paulinho Soledade, e o Manhattan também abriram seus espaços para a Bossa Nova. O homem de televisão Geraldo Casé, responsável pelo que de melhor se fazia em shows de IV abriu uma casa noturna dedicada quase que exclusivamente aos intérpretes da Bossa Nova. O local tinha o sugestivo nome de Rui Bar Bossa. Quando o disco de João Gilberto chegou a São Paulo, a maior concentração de pontos de encontro do pessoal que curtia jazz, MPB e música instrumental estava na Praça Roosevelt e seus arredores. Com ramificações, por exemplo, para os lados da Consolação, onde a boate Cave lançava cantores novos redescobria Aracy de Almeida ou Cyro Monteiro, e mais tarde apresentaria pocket shows, alguns importados do Beco das Garrafas. Neste mesmo rumo, chegava-se até a Rua Sete de Abril, onde a Oásis ainda era ponto de referência nas colunas sociais, e onde tocaram muitos dos músicos que viriam a se engajar na Bossa Nova. Nas boates Cave e Oásis, em São Paulo, foi lançada, com grande sucesso, a cantora e compositora Maysa Monjardim. A Praça Roosevelt, hoje urbanizada com estacionamentos subterrâneos, túneis, supermercado e outras construções, era então um espaço asfaltado, onde durante o dia estacionava um mar de automóveis, à exceção daqueles reservados à feira livre, ou dos fins de semana, quando lá aconteciam simultaneamente vários jogos de futebol do tipo “pelada”. Neste terreno atrás da igreja da Consolação funcionava uma espécie de praia dos paulistas em pleno centro da cidade. À noite, o pessoal a atravessava, com saudosas condições de segurança, para se deslocar da Baiúca, onde tocavam, por exemplo, os conjuntos de Pachá, Moacyr Peixoto, Luiz Loy ou do vibrafonista Garoto, até o outro lado da praça, onde funcionou o Delval de Caco Velho, o primeiro Stardust, onde Alan e Hugo tiveram como crooner, por exemplo, Jane Moraes, e como tecladistas Hermeto Paschoal ou Eli Arcoverde. Neste mesmo “outro lado da praça”, fizeram sucesso o Bon Soir, onde pontificava Walter Santos, ou o Farney’s, que depois virou Djalma, que depois se tornou Zum-Zum e que também entrou na onda dos shows de bolso. Também já faziam a noite paulista Agostinho dos Santos, Maysa e Juca Chaves, que mais tarde participariam dos primeiros espetáculos do gênero realizados na cidade, como o denominado “Festival Nacional da Bossa Nova”, promovido pelo então colunista social Ricardo Amaral, em abril de 1960, no Teatro Record. Como no Rio, entre as gravações mais curtidas por certo tipo de público que viria a se encantar com a nova Bossa Nova estavam a versão cantada por Chet Baker, de My Funny Valentine, e Cry Me a River, com Julie London acompanhada pelo guitarrista Barney Kessel. Na imprensa e nas rádios, a repercussão dos primeiros discos de Bossa Nova, particularmente o de João, foi evidentemente de perplexidade, entusiasmo, e em alguns casos até de indignação No meio dessas polêmicas, pode-se discutir precedências ou premonições, mas a verdade é que tiveram imediata e entusiástica repercussão em colunas como as de Armando Aflalo ou Adones Oliveira, assim como em programas de disc-jóqueis como Fausto Canova. Henrique Lobo, Fausto Macedo ou Walter Silva. São desta época duas frases infelizes, não definitivamente esclarecidas ou superadas, mesmo decorridos 35 anos, e que são inevitavelmente lembradas por quem pretenda estender ao campo da Bossa Nova o espírito de rivalidade entre paulistas e cariocas. Uma delas, em sua versão mais suave, foi proferida logo após quebrarem o disco 78 rpm de João Gilberto, e teria a forma de uma pergunta: “Por que gravam cantores resfriados?”. Sua autoria permanece em dúvida, variando do próprio diretor de vendas da gravadora Odeon em São Paulo até o gerente comercial das Lojas Assunção, então a maior cadeia de eletrodomésticos e de discos do país. A outra, de Vinícius de Moraes, chamava a cidade de “túmulo do samba”, gerando enormes reações a ponto de, em janeiro de 1965, o poetinha ter escrito quatro crônicas para o Diário Carioca, preocupado em esclarecer as circunstâncias nas quais teria sido pronunciada. Segundo ele, o comentário fora endereçado a Johnny Alf, para fazer desaforo a um grupo de grã-finos que estavam bêbados, na boate Cave, e comentaram em voz alta que aquele “cara” desafinava e “não tocava coisa com coisa”. Curiosamente, foi nestes artigos, sob o título de “SP não é mais o túmulo do samba”, que pela primeira vez ele fez referência a certo futuro parceiro, “Chico (..) (filho de meu querido amigo o historiador e sociólogo Sérgio Buarque de Holanda) cujos sambinhas são muito bons”. Entre as respostas à ofensa do poeta, a de um grupo de artistas e jornalistas paulistas, ou lá radicados, foi promover “reuniões de bossa”, que aconteciam em residências como as do maestro Souza Lima, de Renato Mendes ou de Maricene Costa, sempre aos sábados à tarde. Faziam parte desta turma, entre outros, Theo de Barros, Alaíde Costa, Claudete Soares, César Mariano, Walter Wanderley, Yvette, Adones Oliveira, Alberto Helena Jr., Franco Paulino, Luiz Vergueiro, Solano Ribeiro e Moracy do Val. (...) Continua na próxima postagem. Fonte: Revista Caras - Edição Especial de Julho de 1996.
Boa leitura - Namastê
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