Cerimônias fúnebres á beira da sepultura pontilhavam as colinas ondulantes do cemitério
Inglewood Park em um bairro residencial negro nos arredores de
Los Angeles. Toldos brancos protegiam as pessoas do sol mas não podiam bloquear o ronco dos aviões que subiam e desciam no Aeroporto Internacional de Los Angeles ali perto. Por todo o cemitério o cheiro fético dos vapores dos jatos sufocava o odore fresco de grama cortada. Dois dias antes um vôo de passageiros da Holanda trouxera o corpo de um trompetista lembrado como um dos homens mais bonitos dos anos 50.
Chet Baker morrera em
Amsterdam, na sexta feira dia 13 e sabia-se que sua morte misteriosa estava ligada a drogas. Agora depois de anos na Europa estava de volta ao sul da
Califórnia onde conhecera a glória pela primeira vez para galgar o repouso final ao lado do pai. Garoto da zona rural de
Oklahoma, Baker povoara de fantasias a cabeça das pessoas desde o momento em que nasceu. Tudo em relação a ele estava aberto à especulação: Seu estilo cool de tocar trompete tão vulnerável e no estando tão desligado; seu meio sorriso enigmático; a androginia de seu canto doce; um rosto igualmente infantil e sinistro. O som que tirava do seu instrumento levou os fás italianos de Chet a apelidarem de
L´angeloTromba d´oro (o anjo) e (trompete de ouro).
Marc Danval, um escritor da Bélgica, chamava sua música de "(um dos lamentos mais bonitos do século XX) e o comparava a Baudelaire, Rilke e Edgar Allam Poe. Na Europa, até mesmo a prolongada dependência de heroína trabalhava a seu favor, fazendo com que parecesse ainda mais frágil e precioso. Mas nos Estados Unidos sua morte não sensibilizou muita gente. O necrológico de Baker no
New York Time que dava a idade errada (59, em vez de 58), o retratava como um ídolo decadente cuja “sorte fenomenal” se “tornara amargo” devido às drogas. "Alguns críticos disseram que Baker talvez tenha sido superestimando no início", comentava o jornal sobre um músico que certa vez fora proclamado como a Grande Esperança Branca entre os trompetistas de jazz. Apesar de anúncios fúnebres no
Los Angeles Time e no
Hollywood Report, somente cerca de 35 pessoas compareceram ao enterro. "Foi triste, não foi uma celebração", disse o clarinetista e amigo
Bernie Fleischer, colega de longas datas na banda do colégio. "Mas, de qualquer modo, ninguém esperava que ele durasse tanto". Poucos dos que estavam reunidos ali sabiam muita coisa de sua vida no estrangeiro e agora ao olharem para o caixão fechado, ficavam ainda mais intigados com sua morte. Por volta das 03h10 da madrugada a polícia holandesa removera o corpoda clçada, logo abaixo da janela do seu quarto no terceiro andar de um hotel da Estação Ferrovíaria Central de Amsterdam. A poucos passos ficava a
Zeedijk, uma ruela sinuosa, notória como o ponto de venda de drogas mais descarado da Europa. Os policiais despejaram o cadáver anônimo no necrotério, supondo tratar-se de mais um infeliz viciado. No dia seguinte,
Peter Huijts, empresário de turnê holandês de Baker, identificou o corpo. A morte foi dada como suicídio ou acidente introduzido por drogas. Mas havia uma abundância de provas contraditórias. A janela do seu quarto de hotel só abria até trinta centímetro, tornando impossível que ele tivesse caído involuntariamente. Objetos para uso de drogas foram encontrados por todo o quarto, mas um porta-voz da polícia anunciou que sangue de Chet não acusava nenhum indício de heroína, Meses antes de sua morte. Baker dissera a várias pessoas que alguém andava atrás dele. Sua viúva inglesa,
Carol Baker que morava em
Oklahoma com seus três filhos, compartilhava da mesma idéia. "Não foi suicídio, foi crime", insistia. O pianista
Frank Strazzeri, que tocara com Baker pouco tempo antes levou a suspeita ainda mais adiante: "
Eu olho pro caixão e digo:'Que merda, cara, o que aconteceu? O que você fez? Seu idiota, torrou a grana de outro cara. Acabaram matando você". Era típico de Baker deixar todo mundo na dúvida até mesmo na morte. Era um homem de tão poucas palavras e notas que cada uma delas parecia misteriosa e profunda. O escritor inglês
Colin Buter havia notado uma qualidade semelhante em
Jeri Southern, uma cantora e pianista dos anos 50 cujas neuroses lhe valeram um colapso nervoso e a recusa em voltar a cantar. "Era como se ela tivesse olhando no coração de um sonho americano e enxergado os contornos de um pesadelo sobre o qual não se deveria nem falar a respeito", escreveu Butler.
Baker vivera dentro de alguma tormenta sem nome, só sua e extraíra dela uma música de tristeza e de um lirismo tão tocantes que as pessoas se agarraram a ele durante anos, decididas a decifrar o seu segredo. Para
Hiro Kawashima jovem trompetista japonês, Baker era como Buda: "Ele me ensinou sobre a própria vida e eu o considero o 'mestre da vida', por assim dizer". A cantora
Ruth Young, namorada de Baker durante dez anos era tão fascinada por "Picasso" como o chamava, que contrabandeava droga através das fronteiras para ele e uma vez até o ajudou a arrastar um cadáver de dentro de um apartamento europeu e a se desfazer dele. Baker despertou uma obsessão semelhante no fotógrafo
Bruce Weber que pagou pelo eu enterro. De 1986 a 1989m Weber teria gasto 1 milhão de dólares do deu próprio boldo para fazer o documentário
Let´s Get Lost, uma fantasia orgástica sobre um homem cuja aparência nos anos 50 ajudara a inspirar os anúncios homoeróticos deWeber para as roupas íntimas de Clavin Klen. Sua câmera passeou extasiada pelo Baker do final dos anos 80, uma figura que os críticos de cinema chamaram de um a "cadáver cantante" (J. Hoberman, no Village Voice), um "bode decadente" (Julie Salamon, no Wall Street Journal), "uma relíquia de bochechas cavadas, desdentada, sussurrante à beira da morte cerebral" (Charles Champlin, no Los Angeles Times), um "viciado em heroína pouco confiável e conivente" (Lee Jeske, no New Yorl Post), um "sanguessuga" e "fantasma devastado pela droga" (Chip Stern, Rolling Stones). Tudo isso sobre um homem cujos solos eram considerados modelos de expressão sincera, graciosos como poemas. (
Chet Baker -
A Longa Noite de um Mito - James Gavin "Ed. Companhia das Letras - 2003".pags. 11 à 13).